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quarta-feira, 14 de março de 2012

AEROBINO – A VERDADEIRA HISTÓRIA DA BICICLETA VOADORA DE POMPÉU



Por
Geraldo Hamilton Menezes "Tatá"
 

Não me lembro bem se foi no final da década de 1950, ou no princípio de 1960 que conheci Querubino Lacerda, o “Bino”.  Inteligente, autodidata, consertava tudo que lhe caísse às mãos: de uma arma de fogo ao motor de um automóvel. Era o verdadeiro “Professor Pardal” de Pompéu, pequena cidade encravada no noroeste de Minas Gerais.
            “Bino” sonhava transformar uma simples bicicleta movida a pedal em um aparelho voador, um pequeno avião sem motor que o impulsionasse durante a decolagem e o sustentasse durante o voo.  Do sonho à realidade, não perdeu tempo. Desenvolveu na prancheta o esboço do invento, que passou a exibir, esperando convencer pessoas de posse a patrocinarem a construção de sua sonhada invenção. Tudo em vão; ninguém se apresentou. Afinal, o povo considerava o “Bino” um desajustado. E sua ideia, uma maluquice. “Bino” não desistiu; procurou o Matias que, naquele tempo, vendia bicicletas novas e usadas, além de manter uma oficina de consertos na Rua Dona Joaquina, quase esquina com a Rua Félix Dias, com a intenção de comprar uma bicicleta usada que servisse aos seus propósitos. Apesar de surpreendido com a ideia extravagante, Matias ofereceu ao “Bino”, gratuitamente, uma bicicleta nova à sua escolha.
            Aos trancos e barrancos o inventor passou a dedicar, apesar de suas dificuldades financeiras, tempo integral na construção do “Aerobino”, nome pelo qual batizaria seu invento. Achincalhado pelos céticos desde o inicio, não lhe restara outra opção a não ser fechar com paredes seu pequeno galpão-oficina, para trabalhar em paz. O dinheiro era curto; a colaboração de alguns proprietários de oficinas mecânicas, sobretudo do saudoso “Tião da Marica”, não bastava, pois só o ajudavam com empréstimo de ferramentas, soldas etc. Passou a cobrar ingresso dos visitantes. Vendi “cascos” de cervejas muitas vezes, angariando um dinheirinho para admirar o invento em construção. E valeu a pena!
            Finalmente o “Aerobino” ganhou forma e fama sem comprovação de que seu invento voaria por força humana. Uma reportagem sobre o invento e o inventor, na Revista “O Cruzeiro”, despertou o interesse de autoridades da Força Aérea Brasileira, que no segundo semestre de 1963, transportou “Bino” e seu aparelho para o então destacamento de Base Aérea de Belo Horizonte, na Pampulha, onde ele hospedou-se com de honras Oficial- Aviador, assegurando-se lhe todo o apoio técnico para o aperfeiçoamento do equipamento. Além de um quepe de oficial, “Bino” foi distinguido com um crachá da FAB, que o identificava como “Comandante-aviador Bino”.
            No ano seguinte, 1964, exatamente no “Dia do Aviador”, comemorado na data de 23 de outubro, aquela Unidade Militar, em festa, povoada de autoridades e repórteres nacionais e estrangeiros, a verdadeira nata dos grandes veículos de comunicação da época, preparou-se para o primeiro voo do “Aerobino”. “Bino”, rodeado de mecânicos, pilotos, autoridades e representantes da imprensa, envergando um vistoso macacão da FAB e capacete aviador-militar, taxiou, sorridente, o engenho para a pista “31”. Autorizado pela Torre de Controle, tentou ganhar velocidade para a decolagem. Uma, duas, três e mais tentativas, sem sucesso. Cansou-se; foi substituído por um jovem Cabo mecânico de aviões, que também no logrou ganhar o céu. Frustração total; desarranjo intestinal do “Bino” que, cabisbaixo, deixou aquela Unidade da Aeronáutica para sempre.
            O “Aerobino” jamais foi preservado em Museu da Aeronáutica como muitos afirmam. Foi sim, abandonado em um cemitério de sucatas, onde ficava a Secção de Combustíveis da base Aérea. E lá permaneceu carcomido pela ação do tempo, inclusive seu leme de direção, onde se lia a divisa “Aerobino” encimando a palavra “Pompéu”.

Epílogo:
            Com o fracasso do “Bino”, seu sobrinho Afonso (Dete do Nereu para os mais intimos) reconhecidamente um gênio autodidata originário do Buritizal (hoje Silva Campos), então servidor do Ministério da Aeronáutica lotado no Destacamento de Base Aérea da Pampulha, uniu-se ao também servidor da FAB “Zé Mãozinha”, outro “Professor Pardal”, adquiriam o “Aerobino” do inventor e decidiram adaptá-lo com um motor de motocicleta, para convertê-lo em uma aeronave de decolagem vertical, como um helicóptero. Ciente da pretensão de ambos, já esboçada em prancheta, o então comandante da referida Unidade Militar mandou internar “Zé Mãozinha” em uma clínica psiquiatra e transferiu “Dete do Nereu” para a Base Aérea de Cumbica em São Paulo.
            Finalmente “Zé Mãozinha” desmanchou o “Aerobino”, convertendo-o em sua forma originária de bicicleta, que durante muitos anos foi utilizada por seus filhos no Bairro “Vila Clóris – Planalto”, distrito de Venda Nova, Belo Horizonte.
            Dizem que a história tem duas faces: a embusteira e a verdadeira. Neste texto eu contei a verdadeira, da qual participei como testemunha ocular, pois passei quase dez anos na base Aérea de Belo Horizonte.
            “Bino” não era desajustado; como “Dete do Nereu”, era incompreendido porque estava muito além de sua época, no tempo errado.

6 comentários:

  1. Eu tinha 14 anos na época e me lembro perfeitamente de meu pai contando esse caso para o meu avô, já que este ultimo também sonhava em construir um avião movido a pedal. Lembro-me muito bem de meu pai falando que depois que o inventor cansou de pedalar, o comandante escolheu um soldado para substituí-lo. Segundo meu pai, o soldado também pedalou até não poder mais, sem sucesso. Meu avo, meio zangado, respondeu que o projeto dele seria outro. Felizmente ficou só no projeto.

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  2. Fiquei sabendo sobre o Aerobino no livro "Buritizal - A história de Miguelão Capaégua", de José Afonso da Silva. Melhor livro de literatura regional que já li até hoje. No livro, o inventor decola com seu Aerobino e vai morar na lua, exatamente no dia em que Buritizal passa a se chamar Silva Campos. O mais engraçado é que a palavra Buritizal sempre teve importância para mim desde criança. Mesmo sem conhecer o lugar e muito menos ler Guimarães Rosa, que cita os buritis, cheguei a iniciar um livro chamado "No sertão dos buritizais". Como o Aerobino, foi um dos muitos projetos que iniciei e não concluí por conta das críticas dos céticos. Sempre sonho que estava voando sobre uma cidade que conhecia antes, mas agora não posso mais pousar por conta dos fios elétricos... Um dia vou visitar a antiga "Buritizal" e arriscar a sentir muita tristeza, pois as imagens que formaram em minha mente por conta do livro, certamente não existem mais ou quem sabe, só existiram na imaginação do fantástico escritor José Afonso Silva. Obrigado Esperidião! Obrigado pela preciosa informação... As peças de um quebra cabeça estão se encaixando...

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  3. Eu tinha 15/16 anos e meu irmão, Manoel Campos Costa, Neco, que morava em Pompéu, na rua Padre Pedro Pinto, também participava do projeto do Bino. Cheguei a ver referida bicicleta. Tinha asas, varias polias, para permitir o aqcionamento da hélice. Conseguiram levantar
    voo de mais ou menos três metros de altura, no aeroporto de Pompéu, que ficava à direita da antiga estrada de Pompéu a Abeté, passando pela ponte velha, que existe até os dias de hoje, no Velho Chico. Houve inclusive reportagem na revista Cruzeiro.

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    1. Meu pai contava esta história, que acabava com a viagem do Bino e sua aeronave à FAB. Contei pra ele dos testes na Pampulha e ele ficou muito feliz. Disse que a engenhoca e suas engrenagens eram muito interessantes mesmo

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  4. Fico contente em saber mais desta história, tive a honra de conhecer esta bicicleta ou melhor "aerobino".

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