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terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Festa de São Sebastião em Pompéu, memórias


PUBLICADO POR SEBASTIÃO VERLY EM DATAS ESPECIAISMEMÓRIAS By Metro

Nos meus tempos de criança e adolescente, por volta de 1948 a 1960, na cidade onde nasci, a maior diversão, especialmente para a pobreza, eram as festas religiosas. Festa para pobre era a festa religiosa, ali não havia distinção de classe social.
Passada a época das Folias de Reis, que tinham seu auge no dia 6 de janeiro, começávamos a esperar pela festa do glorioso São Sebastião. Eu ficava encantado com tudo. A começar pelos “convites” para a festa, que a gente levava para casa e guardava com cuidado. Todos liam aquele papel distribuído na saída da igreja, no último domingo do ano anterior.
O que chamávamos de convite eram simples folhetos que anunciavam as atividades da semana anterior e do dia da festa, geralmente o domingo mais próximo do dia 20 de janeiro. A maioria das festas contava com a novena, que já se constituía em dupla forma de preparar a comemoração em si.
No folheto, geralmente em papel de cores bem desbotadas, azul, verde, amarelo, até cor de rosa. As letras, pelo menos os títulos, tinham um desenho diferente e eram destacadas em tamanho.
Algumas tradições ainda permanecem. Vinha tudo bem explicadinho:
Festa de São Sebastião
na Matriz de Nossa Senhora da Conceição
em Pompeu
De 11 a 19 de janeiro: novena em louvor a São Sebastião.
Dia 19 à noite após a novena haverá confissões com a partição do nosso querido Padre Pedro Lacerda Gontijo.
Dia 20- Domingo, às 5 horas da madrugada,: alvorada com a Banda de Musica do Senhor Celso Máximo. Queima de Fogos de artificio.
Às 7 horas missa festiva, com cânticos e comunhão.
Às 9 horas missa especial para as crianças.
Às 10 horas, leilão de animais, no terreno ao lado da Igreja
As 18 horas, missa solene com levantamento de mastro e queima de fogos de artificio.
Às 19 horas, leilão de prendas na entrada principal da Matriz apregoado pelo Afonso Martins.
As 20 horas, Barraquinha com Banda de Música e venda de bebidas e salgadinhos, servidos por senhoritas da sociedade.
Pompéu, janeiro de 1952
Festeiros:
José Maria Valadares
Ari Castelo Branco
Durante o mês, os festeiros ou seus enviados percorriam as fazendas pedindo prendas, geralmente bezerros, para serem leiloados no dia da festa. Até meu pai que já não era mais fazendeiro fazia questão de dar um bezerrinho, adquirido de alguém bastante camarada. Conforme a habilidade arrecadadora do padre ou dos festeiros, o bezerro era escolhido a dedo.
Meu pai, ateu convicto, vestia um daqueles dois ou três paletós de brim de cor caqui e na luta contra a asma que o atormentou a vida toda, caminhava lentamente até a igreja que ficava bastante longe de nossa casa. Mamãe nunca saía de casa. Se tivesse de sair seria só na sexta-feira santa, para a procissão do enterro.
Nós vestíamos a melhor roupa, eu me lembro de uma calça curta de um tecido crespo que chamávamos de tussor que usávamos apenas em ocasiões especiais e ficava certo que as meninas estavam todas olhando para mim.
As famílias mais religiosas preparavam prendas como aqueles chamados cartuchos gigantes com amêndoas feitas com amendoim e açúcar, ou colhiam no quintal, na horta ou na roça, uma fruta, um cacho ou uma penca com algum aspecto inusitado para oferecer para o leilão. Uma simples abóbora poderia provocar uma verdadeira algazarra entre os marmanjos que presenciavam o pregão. O importante era o bom humor.
Na hora do leilão dos animais o assunto era mais sério e era bastante comum acordarem entre os presentes de leiloarem em grupo, em duplas ou em ternos para facilitar o trabalho. Nesta hora a conversa era mais seca e simples.
Já o leilão de prendas, na maioria das vezes, apregoado pelo senhor Afonso Martins, era a hora de fazer piadas com as personalidades presentes citando seus hábitos ou situações incomuns. Uma verdadeira comédia “stand up” acontecia ali: “Este pacote de amendoim torrado dizem que é para Tõezinho da Lapa, que já consome bastante este produto”. “E esse doce de cidra é para o Nazareno que está de olho numa moça bonita”; “pacote de pé de moleque para Zé da Rocinha que adora rapadura”. Tem aqui um par de chinelos de lã que é para Zé Cecílio que depois das sete não sai mais de casa… E agora essa melancia de quase 4 quilos (naqueles tempos as melancias eram de um quilo em média). Risos brincadeiras, umas engraçadas outras nem tanto e o dinheiro entrava limpinho para a paróquia.
A barraquinha era construída em cima de uma grama providencial para que não houvesse poeira. Encostado naqueles paus toscos que serviam de apoio horizontal para o fechamento da barraquinha, feito com folhas de coqueiros que também serviam para cobrir o teto do espaço, eu e toda a meninada, passávamos mais de uma ou duas horas ali vendo e ouvindo a banda tocar, e moças alegres, como a Marta do Clode, a Delaidinha da dona Zizinha, a Dilce do Gonte, a Yone do Zé Cecílio, a Zezinha da São e tantas outras, vestidas com aventais de chita corriam para dentro e para fora daquele cômodo pequeno, tudo dividido também com palha do coqueiro, para atender às mesas com as cervejas esfriadas em tambores com água, um pouquinho de gelo e muito sal.
Com muito sono e cansado de ficar em pé, levado pelo meu irmão Verlim que não perdia uma festa, voltávamos para casa lá no distante bairro d’os Cristos. Cansados, sonolentos, mas alegres e felizes. Já sonhávamos com a festa do ano seguinte que tinha já como festeiros anunciados na barraquinha, o Lili do Xisto e o Tuniquinho Afonso.

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Sebastião Verly - Sociólogo, Cronista, residente em Belo Horizonte - MG.

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