J
Matthew Futterman, jornalista do Wall Street
Journal
“não compre a história de que esta perda vai deixar
alguma cicatriz indelével em um país tentando desesperadamente prosperar em uma
série de áreas que não têm nada a ver com futebol. Essa idéia é um pouco
humilhante para os brasileiros, que são a coleção de almas mais acolhedoras com
que eu me deparei”
Adivinhe o que aconteceu no Brasil na quarta-feira?
O sol apareceu. As pessoas foram para o trabalho. Elas
dirigiram táxis, abriram supermercados, clicaram em seus computadores para
tratar de assuntos jurídicos e financeiros. Médicos curaram os doentes.
Assistentes sociais enfrentaram os problemas da grande pobreza neste país de
cerca de 200 milhões. A vida continuou.
Adivinha o que não aconteceu? Cidades não queimaram.
Rebeliões em massa não aconteceram. Tanto quanto sabemos, torcedores não se
jogaram de edifícios porque sua amada Seleção foi destruída pela Alemanha, por
7-1, na semifinal da Copa.
À luz cruel do dia, ainda é estranho escrever “Alemanha
7, Brasil 1.” Esse tipo de resultado não acontece neste nível de futebol. O último
jogo oficial que o Brasil perdeu em casa foi em 1975. Se eu fosse um nativo,
estaria abalado, tentando descrever a debacle que aconteceu em Belo Horizonte.
Não se engane: a derrota para a Alemanha, para usar a
frase favorita do técnico dos EUA, Jurgen Klinsmann, foi uma lástima. As
pessoas aqui amam o futebol. O governo declara feriados nos dias de partidas da
equipe nacional. Ruas vazias, e eu quero dizer vazias – como se você pudesse
montar uma barraca no meio de uma delas e não acontecer nada.
Ainda assim, não compre a história de que esta perda vai
deixar alguma cicatriz indelével em um país tentando desesperadamente prosperar
em uma série de áreas que não têm nada a ver com futebol. Essa idéia é um pouco
humilhante para os brasileiros, que são a coleção de almas mais acolhedoras com
que eu me deparei.
Houve a mulher na loja de óculos aqui em São Paulo que se
recusou a aceitar dinheiro pelo estojo de óculos que ela me deu depois que eu
perdi o meu. Houve os estudantes universitários em Natal que me ofereceram um
tour pela cidade e uma carona de volta para meu hotel no meio da noite, quando
não havia transporte à vista após a vitória dos EUA sobre Gana.
Embrulhando
o peixe
Lá estava o rabino que, 30 segundos depois de me
conhecer, insistiu para que eu fosse jantar no sábado em sua casa (eu fui, e a
sopa de matzo ball estava incrível). Houve as inúmeras almas pacientes comigo
na rua, esperando enquanto eu tateava meu dicionário de bolso de português,
procurando a palavra certa para completar uma pergunta idiota, quando
certamente eles tinham algo melhor para fazer.
Estive aqui por um mês. Isso dificilmente me qualifica
como um especialista na cultura brasileira. Minha amostragem é pequena e
limitada a hotéis, restaurantes, estádios de futebol e pistas de corrida ao
lado de praias do Rio, Natal, Recife e algumas outras cidades-sedes. Eu sei do
crime e da pobreza.
Mas eu também sei que este é um país incrível, diverso.
Encare quatro horas de voo rumo à Amazônia a partir de São Paulo e as pessoas
parecem completamente diferentes daquelas em qualquer shopping do país. Em
Salvador, você pode muito bem achar que está na África Ocidental. Em cada
cidade, pessoas de todos os tons de pele — preto, marrom e branco — preenchem
áreas de ricos e pobres. É um país de beleza física impressionante e vastos
recursos naturais. O tráfego da hora do rush faz as avenidas de Los Angeles
parecerem estradas do interior, um sinal claro de que o lugar precisa de alguns
melhoramentos de infra-estrutura, mas também que há um grande número pessoas
trabalhadoras que querem tornar o amanhã melhor do que hoje.
Em outras palavras, o Brasil é muito mais do que uma
camisa canarinho e uma obsessão com o futebol.
O colapso contra a Alemanha certamente vai despertar
algum exame de consciência nacional sobre como o Brasil cultiva e desenvolve a
sua próxima geração de estrelas do futebol. O país tem um enorme banco de
talentos, mas acidentes não podem mais acontecer no esporte. Vencer nesse nível
hoje significa não apenas talento, mas dinheiro, treinamento e uma estratégia
coerente.
“Quando você pensa sobre isso”, disse uma brasileira de
20 e poucos em um bar na noite passada,
“é meio engraçado. Quer dizer, sete gols. É engraçado, né?”
Eu vou apostar que o Brasil como um todo vai se sair
muito bem depois disso. Chateado um pouco, claro, mas em última análise, tudo
vai dar certo. De muitas maneiras, já deu.
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