quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Juíza poeta deixa advogado irritado por verso sobre picanha.

Decisão negou pedido de indenização a cliente que comprou carne de má qualidade como se fosse picanha

PUBLICADO EM 13/11/18 - 16h59

Clarisse Souza

Uma juíza proferiu uma sentença inusitada para uma ação não menos curiosa que chegou à 1ª Vara da Comarca de Cambuí, no Sul de Minas.

A decisão, em forma de poesia, negou o pedido de indenização no valor de R$ 15 mil ao cliente de um supermercado da cidade que se sentiu lesado por comprar uma carne de má qualidade como se fosse picanha.

Nos versos, a magistrada sugere que o autor do processo “troque de fornecedor/ ou sem muita dor,/compre a carne correta!”, e conclui: “Para encerrar esta demanda,/ nem indenização nem valor gasto./ Finde-se o processo/ e volte-se com o boi ao pasto”. 

A confusão que deu origem à ação começou em agosto de 2017, quando Albertino de Almeida Xavier, autor do processo, foi até um estabelecimento comercial de Cambuí comprar carne para um churrasco entre amigos.

O preço baixo – pouco mais de R$ 17/ kg – atraiu o cliente, que decidiu levar o produto. Ao degustar, no entanto, ele e os amigos notaram que a peça estava dura, com características incompatíveis com o que havia sido vendido. De volta ao supermercado, o gerente negou a possibilidade de troca. 

Na decisão publicada em outubro deste ano, a juíza Patrícia Vialli Nicolini, afirma ser verdade que a carne não era de qualidade. No entanto, considerou improcedente o pedido de indenização por danos morais.

“Foi apenas um aborrecimento, um desacerto contratual. Isso não fere a personalidade, não diminui a pessoa, não a coloca em menosprezo”, esclareceu Patrícia. 

Essa não é a primeira vez que a juíza usa poesia para anunciar uma sentença. “Curiosamente, as outras duas vezes também foram indenizações por danos morais, em situações em que realmente não era cabível”, lembrou Patrícia.

Ela contou que no caso da ação contra o supermercado, o poema-sentença foi criado em cerca de 10 minutos.

Segundo a juíza, não há empecilho para usar poesia em casos como esse. “Desde que se cumpra as fases que a sentença deve ter, é perfeitamente cabível”, garantiu. 

Defesa

A decisão em forma de poesia desagradou a defesa de Xavier, que recorreu. “Entendo que a sentença não foi justa com o caso”, disse o advogado Joao Bosco Bello. Para ele, a ideia de redigir a conclusão do caso em forma de poesia foi “desrespeitosa”.

A magistrada discorda. “São situações diferentes, peculiares. A intenção é que, de uma forma lúdica, o cidadão entenda que o Judiciário está sendo acionado sem a necessidade que a pessoa imagina”, afirmou.

Confira o poema na íntegra:

Vou lhe contar um fato,

que é de arrepiar!

O homem foi ao supermercado,

para picanha comprar.

Iria de um churrasco participar.

Comprou picanha fatiada,

quis economizar!

Na festa foi advertido,

o tira-gosto estava duro,

comentou após ter comido.

Seu amigo atestou,

não era picanha não!

Bora reclamar,

para não ficar na mão.

A requerida recusou,

não quis a carne trocar.

Por tal desaforo,

resolveu demandar.

Queria danos morais,

como forma de enricar

e picanha verdadeira comprar.

Este fato tenho que decidir,

com bom senso agir.

Dar o desate à lide

e o processo concluir.

O pedido é improcedente.

Se a carne não era de qualidade,

era bem verdade.

Mas para tanto não presta.

A gerar danos morais,

compelir indenização,

pelo mau gosto da peça.

Troque de fornecedor

ou sem muita dor,

compre a carne correta!

Para encerrar esta demanda,

nem indenização nem valor gasto.

Finde-se o processo

e volte-se com o boi ao pasto.

Posto isto e algo mais a considerar!

A lide é improcedente, nada há a indenizar.

Resta a todos censurar.

E o presente feito encerrar.

Ao pagamento das custas condeno o autor.

Dos honorários também.

Amparado pela Justiça Gratuita, estes ficam suspensos.

Que nada se cobre de ninguém.

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