Mudança no atendimento do Instituto-Geral de Perícias (IGP) busca agilizar o processo, mas pode prejudicar ações movidas pelas famílias das vítimas, segundo especialistas
Fernanda da Costa
O Instituto-Geral de Perícias (IGP) deixará de analisar acidentes com morte nos 5,8 mil quilômetros de rodovias federais do Estado. A regra deve ser oficializada em reunião no dia 18, em Porto Alegre.
Só que, embora agilize os atendimentos a acidentes, a medida pode prejudicar as famílias das vítimas, segundo especialistas, diante da perda de provas importantes para a investigação policial.
O diretor do Departamento de Perícias do Interior do IGP, Rogério Gomes Saldanha, confirma que a decisão de os peritos não realizarem mais os levantamentos nos locais dos acidentes já é adotada em três das nove coordenadorias regionais do órgão: Caxias do Sul, Santo Ângelo e Passo Fundo.
O departamento não soube informar, porém, desde quando cada região adotou a medida. Segundo Saldanha, sem a necessidade de se deslocar às rodovias, os peritos examinarão apenas os veículos, em depósitos, e as vítimas, no Departamento Médico Legal.
A medida só deve ser adotada em todo o Estado _ em estradas federais _, depois de uma reunião do órgão com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), a Polícia Civil e o Ministério Público, marcada para o dia 18. Uma reunião na manhã desta segunda-feira entre os órgãos debateu o assunto e os detalhes serão definidos na próxima rodada.
O argumento para a mudança é um decreto federal em vigor desde 1995, que atribui à PRF a responsabilidade de fazer os levantamentos nos locais dos acidentes. A explicação para organizar o procedimento apenas 17 anos depois foi a antiga autonomia das coordenadorias regionais do IGP.
_ Antes, cada região definia seus processos em acordos com a Polícia Civil. Com a criação do Departamento de Perícias do Interior, há seis meses, surgiu a demanda da padronizar _ afirma o diretor.
Ele explica que os levantamentos da PRF são completos o suficiente, e que o objetivo do IGP é evitar o retrabalho. Isso garantiria mais agilidade no atendimento aos acidentes com morte nas rodovias federais, além de cessar com a espera dos policiais para a chegada dos peritos.
_ Muitas vezes, os peritos estão atendendo outros casos, como homicídios, e demoram horas para chegar ao local do acidente. A liberação mais rápida da via beneficia os usuários _ observa Saldanha.
Medida pode fazer com que provas importantes sejam perdidas
Para os especialistas em trânsito, no entanto, a ausência dos levantamentos in loco do IGP deve prejudicar futuras ações de homicídio de trânsito, movidas pelas famílias das vítimas. O engenheiro perito em trânsito Walter Kauffmann Neto afirma que as informações do órgão são essenciais para os processos judiciais, por serem mais detalhadas. Para ele, é necessário que um perito especializado colete e interprete os dados no local:
_ O trabalho do IGP é um complemento ao da PRF. Se a perícia é falha ou incompleta, podemos não apurar os culpados pelas mortes no trânsito.
O defensor público e representante do órgão no Comitê Estadual do Trânsito, Juliano Viali dos Santos, explica que os levantamentos do IGP, por ser um órgão técnico do Estado, são usados para elucidar os casos. Qualquer detalhe perdido nesta apuração, afirma, pode fazer falta na hora do julgamento.
_ Se estes levantamentos ficarem vinculados a policiais sem qualificação, pode ser um problema depois. O corpo de profissionais do IGP é mais qualificado _ ressalta Santos.
A opinião é compartilhada pelo advogado André Moura, diretor da Escola do Instituto dos Advogados do Estado especialista em ações de trânsito. Ele ressalta que a análise do IGP no local do crime é uma prova fundamental para a Justiça. Segundo Moura, a solução para ter agilidade na liberação das rodovias é aumentar o número de peritos e policiais, e não mudar o processo.
A diretora da Divisão de Trânsito da Polícia Civil da Capital, delegada Viviane Viegas, disse que o órgão não se manifestará sobre o caso antes da reunião de hoje com o IGP.
Mesmo sem acordo, policiais mudam processo
O trabalho dos policiais rodoviários federais não deve mudar, segundo a assessoria de imprensa do órgão, mas orientações oficiais devem ser definidas após a reunião com o IGP. Enquanto isso, já estão sendo adotadas medidas diferenciadas diante da ausência dos peritos no local do acidente.
A mudança surpreendeu as polícias rodoviárias. Na 14ª delegacia da PRF, com sede em Sarandi, a notificação do IGP foi recebida em 24 de janeiro. Mesmo sem orientação oficial, o chefe do Núcleo de Policiamento e Fiscalização da delegacia, Fabricio Moisés Ziani, afirma que os policiais já mudaram alguns hábitos no registro de ocorrências, com objetivo de fornecer um levantamento mais completo à Polícia Civil.
_ Sem os peritos no local, podemos ter de acrescentar mais detalhes aos registros _ admite Ziani.
Dados sobre as vítimas foram adicionados aos levantamentos e mais fotos foram tiradas do local e dos veículos envolvidos. Um dos exemplos foi no atendimento de um dos acidentes mais graves do ano, na rodovia Soledade-Lajeado (BR-386), que causou a morte de quatro pessoas da mesma família no dia 9 de fevereiro, em São José do Herval, no Vale do Taquari. Na ocasião, somente os policiais rodoviários realizaram o levantamento do local.
A mudança na prática
_ Os peritos não vão se deslocar aos locais dos acidentes com morte nas estradas federais, para realizar levantamentos, uma vez que o processo é atribuição da PRF, conforme decreto federal de 1995.
_ As perícias nos veículos, em depósitos, e nas vítimas, no Departamento Médico Legal, seguem sendo realizadas pelos peritos do IGP.
_ Como o número de peritos é reduzido no Interior, argumenta o IGP, a espera dos policiais rodoviários pelos profissionais pode demorar horas. Sem precisar aguardar os técnicos, as rodovias serão liberadas mais rápido.
_ Por outro lado, especialistas em trânsito afirmam que as ações judiciais movidas pelas famílias das vítimas podem perder detalhes importantes _ devido à análise feita por policiais, e não por peritos _ e os culpados pelas mortes podem ficar impunes.
Como são os levantamentos hojePOLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL
_ Em acidentes com lesão corporal ou morte, a PRF aciona a Polícia Civil, que pode solicitar o levantamento do IGP.
_ Neste caso, isolam o local e orientam o trânsito, até a chegada dos peritos. No Interior, onde o quadro de peritos é reduzido, a demora pode levar horas.
_ Em seu levantamento, a PRF descreve a posição do veículo, com medição de distâncias, e interpreta a posição deles antes do acidente.
_ Observa as condições da via e sinais deixados pelos veículos, como marcas de pneus.
_ Analisa os danos nos veículos.
_ Realiza levantamento fotográfico dos veículos e do local.
INSTITUTO-GERAL DE PERÍCIAS
_ No local dos acidentes, o órgão analisa a posição dos veículos, com medição de distâncias.
_ Descreve as condições de conservação e o desenho da pista (se o acidente foi em uma reta ou em uma curva, por exemplo).
_ Observa a sinalização presente no local, como de ultrapassagem proibida. _ Faz um levantamento fotográfico da rodovia e dos veículos. Muitas vezes, as vítimas não estão mais no local.
_ A perícia mecânica nos veículos, que avalia estado de conservação e o funcionamento, é feita em um depósito, por engenheiros especializados. Esta análise permanecerá sob os cuidados do IGP.
_ A necropsia ocorre no Departamento Médico Legal e seguirá sendo feita pelo IGP.
Como é em outros Estados
SANTA CATARINA
O Instituto-Geral de Perícia de Santa Catarina não possui uma regra interna sobre os atendimentos em rodovias federais e atendem os chamados sempre que recebem uma solicitação da Polícia Civil. No entanto, a diretora do Instituto de Criminalística do órgão, Margarete Goularte, afirma que os peritos são acionados pela polícia em apenas 5% das ocorrências de acidentes com morte nas rodovias federais. Segundo ela, cada delegado decide chamar ou não o IGP, conforme sua interpretação da lei.
PARANÁO diretor do Instituto de Criminalística do Paraná, Marco Aurélio Bertoldi Pimpão, afirma que os peritos atendem a todos os acidentes de trânsito com morte, com deslocamentos para rodovias federais e estaduais para realizar os levantamentos. Para ele, a ida do perito ao local garante mais riqueza de informações, como detalhes sobre a sinalização da pista e a condição dos veículos, por exemplo.
Só que, embora agilize os atendimentos a acidentes, a medida pode prejudicar as famílias das vítimas, segundo especialistas, diante da perda de provas importantes para a investigação policial.
O diretor do Departamento de Perícias do Interior do IGP, Rogério Gomes Saldanha, confirma que a decisão de os peritos não realizarem mais os levantamentos nos locais dos acidentes já é adotada em três das nove coordenadorias regionais do órgão: Caxias do Sul, Santo Ângelo e Passo Fundo.
O departamento não soube informar, porém, desde quando cada região adotou a medida. Segundo Saldanha, sem a necessidade de se deslocar às rodovias, os peritos examinarão apenas os veículos, em depósitos, e as vítimas, no Departamento Médico Legal.
A medida só deve ser adotada em todo o Estado _ em estradas federais _, depois de uma reunião do órgão com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), a Polícia Civil e o Ministério Público, marcada para o dia 18. Uma reunião na manhã desta segunda-feira entre os órgãos debateu o assunto e os detalhes serão definidos na próxima rodada.
O argumento para a mudança é um decreto federal em vigor desde 1995, que atribui à PRF a responsabilidade de fazer os levantamentos nos locais dos acidentes. A explicação para organizar o procedimento apenas 17 anos depois foi a antiga autonomia das coordenadorias regionais do IGP.
_ Antes, cada região definia seus processos em acordos com a Polícia Civil. Com a criação do Departamento de Perícias do Interior, há seis meses, surgiu a demanda da padronizar _ afirma o diretor.
Ele explica que os levantamentos da PRF são completos o suficiente, e que o objetivo do IGP é evitar o retrabalho. Isso garantiria mais agilidade no atendimento aos acidentes com morte nas rodovias federais, além de cessar com a espera dos policiais para a chegada dos peritos.
_ Muitas vezes, os peritos estão atendendo outros casos, como homicídios, e demoram horas para chegar ao local do acidente. A liberação mais rápida da via beneficia os usuários _ observa Saldanha.
Medida pode fazer com que provas importantes sejam perdidas
Para os especialistas em trânsito, no entanto, a ausência dos levantamentos in loco do IGP deve prejudicar futuras ações de homicídio de trânsito, movidas pelas famílias das vítimas. O engenheiro perito em trânsito Walter Kauffmann Neto afirma que as informações do órgão são essenciais para os processos judiciais, por serem mais detalhadas. Para ele, é necessário que um perito especializado colete e interprete os dados no local:
_ O trabalho do IGP é um complemento ao da PRF. Se a perícia é falha ou incompleta, podemos não apurar os culpados pelas mortes no trânsito.
O defensor público e representante do órgão no Comitê Estadual do Trânsito, Juliano Viali dos Santos, explica que os levantamentos do IGP, por ser um órgão técnico do Estado, são usados para elucidar os casos. Qualquer detalhe perdido nesta apuração, afirma, pode fazer falta na hora do julgamento.
_ Se estes levantamentos ficarem vinculados a policiais sem qualificação, pode ser um problema depois. O corpo de profissionais do IGP é mais qualificado _ ressalta Santos.
A opinião é compartilhada pelo advogado André Moura, diretor da Escola do Instituto dos Advogados do Estado especialista em ações de trânsito. Ele ressalta que a análise do IGP no local do crime é uma prova fundamental para a Justiça. Segundo Moura, a solução para ter agilidade na liberação das rodovias é aumentar o número de peritos e policiais, e não mudar o processo.
A diretora da Divisão de Trânsito da Polícia Civil da Capital, delegada Viviane Viegas, disse que o órgão não se manifestará sobre o caso antes da reunião de hoje com o IGP.
Mesmo sem acordo, policiais mudam processo
O trabalho dos policiais rodoviários federais não deve mudar, segundo a assessoria de imprensa do órgão, mas orientações oficiais devem ser definidas após a reunião com o IGP. Enquanto isso, já estão sendo adotadas medidas diferenciadas diante da ausência dos peritos no local do acidente.
A mudança surpreendeu as polícias rodoviárias. Na 14ª delegacia da PRF, com sede em Sarandi, a notificação do IGP foi recebida em 24 de janeiro. Mesmo sem orientação oficial, o chefe do Núcleo de Policiamento e Fiscalização da delegacia, Fabricio Moisés Ziani, afirma que os policiais já mudaram alguns hábitos no registro de ocorrências, com objetivo de fornecer um levantamento mais completo à Polícia Civil.
_ Sem os peritos no local, podemos ter de acrescentar mais detalhes aos registros _ admite Ziani.
Dados sobre as vítimas foram adicionados aos levantamentos e mais fotos foram tiradas do local e dos veículos envolvidos. Um dos exemplos foi no atendimento de um dos acidentes mais graves do ano, na rodovia Soledade-Lajeado (BR-386), que causou a morte de quatro pessoas da mesma família no dia 9 de fevereiro, em São José do Herval, no Vale do Taquari. Na ocasião, somente os policiais rodoviários realizaram o levantamento do local.
A mudança na prática
_ Os peritos não vão se deslocar aos locais dos acidentes com morte nas estradas federais, para realizar levantamentos, uma vez que o processo é atribuição da PRF, conforme decreto federal de 1995.
_ As perícias nos veículos, em depósitos, e nas vítimas, no Departamento Médico Legal, seguem sendo realizadas pelos peritos do IGP.
_ Como o número de peritos é reduzido no Interior, argumenta o IGP, a espera dos policiais rodoviários pelos profissionais pode demorar horas. Sem precisar aguardar os técnicos, as rodovias serão liberadas mais rápido.
_ Por outro lado, especialistas em trânsito afirmam que as ações judiciais movidas pelas famílias das vítimas podem perder detalhes importantes _ devido à análise feita por policiais, e não por peritos _ e os culpados pelas mortes podem ficar impunes.
Como são os levantamentos hojePOLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL
_ Em acidentes com lesão corporal ou morte, a PRF aciona a Polícia Civil, que pode solicitar o levantamento do IGP.
_ Neste caso, isolam o local e orientam o trânsito, até a chegada dos peritos. No Interior, onde o quadro de peritos é reduzido, a demora pode levar horas.
_ Em seu levantamento, a PRF descreve a posição do veículo, com medição de distâncias, e interpreta a posição deles antes do acidente.
_ Observa as condições da via e sinais deixados pelos veículos, como marcas de pneus.
_ Analisa os danos nos veículos.
_ Realiza levantamento fotográfico dos veículos e do local.
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_ No local dos acidentes, o órgão analisa a posição dos veículos, com medição de distâncias.
_ Descreve as condições de conservação e o desenho da pista (se o acidente foi em uma reta ou em uma curva, por exemplo).
_ Observa a sinalização presente no local, como de ultrapassagem proibida. _ Faz um levantamento fotográfico da rodovia e dos veículos. Muitas vezes, as vítimas não estão mais no local.
_ A perícia mecânica nos veículos, que avalia estado de conservação e o funcionamento, é feita em um depósito, por engenheiros especializados. Esta análise permanecerá sob os cuidados do IGP.
_ A necropsia ocorre no Departamento Médico Legal e seguirá sendo feita pelo IGP.
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PARANÁO diretor do Instituto de Criminalística do Paraná, Marco Aurélio Bertoldi Pimpão, afirma que os peritos atendem a todos os acidentes de trânsito com morte, com deslocamentos para rodovias federais e estaduais para realizar os levantamentos. Para ele, a ida do perito ao local garante mais riqueza de informações, como detalhes sobre a sinalização da pista e a condição dos veículos, por exemplo.
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